Decidiram deixar o gado sob o sol que castiga o Nordeste e ir ao com�cio de um governador-candidato em algum lugar do semi-�rido.
– J� viu o home de perto alguma vez?
– S� ouvi falar no r�dio, tem voz de gente s�ria.
– Com� que a gente vai saber quem �?
– Ah, o sinhozinho deve de vir de terno e gravata, n�!
– Ser� que vai trazer cesta b�sica?
– N�is precisa � de �gua, Severino.
– Cumpade, o pesso� fala que existem dois home: o governador e o candidato, cumplicado isso…
– Se pelo menos um deles trazer �gua pra gente, j� t� b�o.
– E com� que a gente vai saber quem � quem?
– Hum, quem vai vir � o candidato, n�? O governador deve de ficar em casa cuidando das nossas riquezas.
– Verdade. E se o candidato prometer trazer �gua e n�o cumprir?
– A� n�is v�o ter que apelar para o governador.
– Mas se at� hoje o governador num trouxe, n�is v�o ter que acreditar no candidato, home!
Sil�ncio. Serafino tira o chap�u de palha que aquece a cabe�a, gente vem chegando de todos os lados, arrastando o chinelo de couro no solo empoeirado, c�mplice de suas agruras. O velho passa os dedos nos cabelos grisalhos, recoloca o chap�u e continua:
– Verdade, ent�o n�is v�o ter que pressionar ele.
– E com� que a gente vai fazer isso?
– Tenho uma id�ia. Vamo chamar ele pruma prosa l� em casa. A Creolinda prepara um caf�.
– Mas com� que vai fazer caf� se num tem �gua?
– Proc� v� minha esperteza. Quando ele pedir o caf�, vai ver que n�is precisa de �gua!
– Cumpade � muito inteligente mesmo.
– A professorinha do meu fio fala que hoje a gente tem que trabalhar com a cabe�a.
– Cumpade me desculpa a ignor�ncia, t� mais acostumado com a enxada. Ouvi falar no r�dio tamb�m que ele tem a solu��o pros nossos problemas de �gua. Comenta por a� que ele vai desvia �gua da bacia do S�o Francisco pra irrigar nossa regi�o.
O velho Serafino co�a o queixo e lan�a um olhar desconfiado ao amigo:
– S�o Francisco de Assis?
– Deve de ser.
– Pecado! Desviar �gua de santo? Prefiro morrer de sede do que beber �gua roubada da bacia do S�o Francisco. Quem falou isso?
– O candidato t� prometendo.
– Caboclo cara de pau esse home. E n�is aqui esperando ele pra ouvir isso. Eu vou pra casa!
– Num vai chamar ele pruma prosa?
– N�o sinh�. S� volto aqui se for pra falar com o governador! Esse candidato num me agrad�. Desviar �gua de santo? N�o sinh�.
E saiu pisando firme, chap�u � m�o, olhando para a poeira que levantava, ch�o confidente de seu sofrimento, para l� de longe olhar novamente o compadre:
– Salve S�o Francisco!